sábado, 6 de setembro de 2014

A graça da morte

Há um texto que circula na Internet atribuido a diversos autores, como costuma acontecer nesse ambiente, que diz que a morte não tem graça. Pois não é que tem! A morte é muito engraçada. Há quem não goste, mas geralmente não provou dela ainda. A morte é imprevisível. Isto é bom. Dostoievski foi condenado à morte indevidamente e teve a data da execução marcada. Escreveu com desespero sobre este período em que sabia que ia morrer. Depois a execução foi cancelada e foi libertado, mas ficaram as marcas destes momentos em que pensava que sua vida estava com os dias contados. Dito assim parece uma bobagem, pois não estamos todos com os dias contados? Mas esta é a diferença. Não sabemos quantos são estes dias e isto é parte da graça da morte, que não tem a menor graça quando o dia está marcado. Isto explica o suicídio, que muitos já sentiram atração e tantos tentam todos os dias. Ninguém quer morrer, mas se matar é uma tentação muito grande. Por que será? Temos dois instintos principais: eros e tânatos. O instinto da vida, da preservação, do amor, da criatividade, é eros. É o que nos mantém vivos e felizes, embora insatisfeitos. O instinto tânatos nos puxa para a morte, para acabar com a dúvida, o sofrimento, a insegurança, nos atrai para a paz do cemitério, para a satisfação final. A morte é uma porta próxima que não queremos passar, apenas porque ignoramos o que tem do outro lado. Quem passa não volta para contar o que há lá. A fé nos leva a acreditar que pode ter coisas boas, mas quem consegue pesar a fé, olhar no microscópio, detectar no raio-x. Apenas a fé parece pouco para a maioria. Então nos iludimos a seguir a vida como se essa porta sinistra nunca fosse ser transposta. Acredito que do outro lado dela tem um monte de gente com balões e bolo nos esperando e prontos para cantar parabéns a você tão logo atravessemos este obstáculo: é pique, é pique, é hora, é hora, rá tim bum: airam, airam, airam.

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